Atual tri-campeão carioca, campeão brasileiro, vice campeão da Liga Sul-Americana e líder isolado do Novo Basquete Brasil, com nove vitórias em dez jogos, a equipe de basquete do Flamengo enfrenta o desrespeito grosseiro da diretoria e o amadorismo flagrante do clube, que vai do futebol aos combalidos esportes olímpicos. Bi-campeão sul americano em 1953 e 61, o basquete do Flamengo passou décadas em descaso, sem jamais encontrar seu rumo novamente.
Tudo começou a mudar quando a diretoria passou a investir de modo mais incisivo na modalidade na metade desta década. A reformulação do basquete, comandada por Patrícia Amorim, diretora de esportes olímpicos, conseguiu trazer nomes de peso como o ala Marcelinho, um dos principais jogadores da seleção brasileira, tri-campeão pan-americano e que estava na liga da Lituânia (uma das mais fortes do mundo), seu irmão Duda e o pivô Rafael Baby, que teve início promissor na NBA, passando por Toronto Raptors e Utah Jazz.
Formando uma equipe com talento e experiência somada a alguns garotos de enorme potencial, os resultados foram alcançados muito rapidamente. Basta olhar todos os títulos e feitos descritos no início desta matéria.
Assistindo ontem ao jogo entre Flamengo e Cetaf, pela NBB, a situação crítica dos jogadores me chamou a atenção. Sem receber há 4 meses e enfrentando total descaso da diretoria, é de impressionar que estes profissionais continuem a jogar pelo time, cumprindo seus compromissos. O que você faria se estivesse há 2, 3, 4 meses sem receber? Jogadores de renome e história no esporte, que aceitaram receber menos do que ganhavam lá fora, em parte por amor ao clube, poder voltar a sua cidade natal e jogar com seu irmão, caso de Marcelinho Machado, disparado o principal jogador e cestinha do país nas últimas temporadas (e na atual), em parte por estarem em fase de reconstrução da carreira, como Baby, chega a constranger o que eles são obrigados a enfrentar.
A incompetência, corrupção, amadorismo, disputas internas estúpidas por velhos retrógados e acomodados que não levam nada à nada afundam o Flamengo há décadas. O futebol, principal “produto” do clube, também enfrenta salários atrasados há três meses. Uma notícia extremamente velha, diga-se. Novidade é quando recebem em dia.
O que dirá os esportes olímpicos. Após serem quase que totalmente desativados recentemente, num episódio conhecido por todos, a situação não dá sinais de melhora. Mesmo afirmando que “acabou o dinheiro”, fala do presidente Márcio Braga, a ginástica foi salva por uma parceria com a prefeitura de Niterói e, se não me engano, o basquete e o remo não podem ser desativados por causa do estatuto do clube. Chego a especular que o salário de qualquer um dos principais jogadores de futebol do Flamengo dê para cobrir a remuneração de toda a equipe e comissão técnica do basquete. Atualmente, somente a folha salarial do futebol engole R$ 4,8 milhões de reais todos os meses – uma das mais caras do Brasil.
Marcelinho desabafou:
“Tentamos conversar, ouvimos promessas, mas esta situação chegou em um ponto em que está faltando respeito com todos aqui do basquete. Estamos há quatro meses sem salários, não temos uma satisfação, nada. Todos no grupo estão mostrando caráter e compromisso com esta camisa, com as tradições do clube, a equipe não deixa de dar o máximo, dar o sangue em quadra, estamos liderando o NBB e na fase final da Liga Sul-Americana. Queremos respeito, não merecemos isso”
Realmente, não merecem. Não há como cobrar nada de profissionais que não recebem pelo seu trabalho e além disso não gozam do mínimo de respeito da diretoria (leia-se “empresa”) onde trabalham. É como se seu empregador, além de não te pagar há 4 meses, tivesse feito promessas vazias e após isso simplesmente se cala, tornando-se incomunicável. E como eles respondem? Com a liderança do NBB.
Patrícia Amorim, responsável pelos esportes olímpicos, o principal nome da reformulação deste setor do clube, sempre em contato direto com os atletas, foi demitida há pouco mais de um mês num dos inúmeros episódios nebulosos (disse-me-disse) que ocorrem na Gávea. É extremamente lamentável que uma das maiores instituições esportivas do país se encontrem numa situação caótica como esta.
Caos criado pelo câncer do amadorismo e corrupção que infesta tantos outros clubes. Da base até a política, não dá pra esperar nenhuma melhora significativa no esporte brasileiro no todo enquanto estivermos a mercê de tanta lama. CBB, COB, CBF, confederações estaduais, clubes, ninguém se salva. E todos, absolutamente todos, dos atletas aos torcedores, passando pela formação de base, a economia, a sociedade e toda a cadeia produtiva, criativa e social que o esporte envolve, perdem muito com isso. Um pouco de vergonha e trabalho sério não faz mal a ninguém.
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