Nunca mais o sorriso fácil
o deleite carnal
as madrugadas perdidas
as avenidas movimentadas
.
Nunca mais o cerão, o café preto
o lixo, o ego, a mesquinharia
o metrô apinhado
nunca mais
.
Nunca mais os raios de sol, a hipocrisia
a futilidade, o torpor, o ódio
Nunca mais o quarto bagunçado, a louça suja, a facada nas costas
as aparências, nunca mais
.
As manhãs claras, a areia da praia, o cheiro de mato
Nunca mais
Nunca mais o upload, a notícia barata, o trabalho braçal
o sorriso amargo
.
Nunca mais a mentira, a falta de tesão
o almoço nas praças
a tecnologia, a fruta doce e artificial
a água que escorre
.
Nunca mais as enchentes, a roupa suja, as noites perdidas em lugares abafados
a embriaguez da cerveja, o torpor do vinho
o frio nas pernas
a ilusão do respeito
.
Nunca mais o celular, o aluguel, a utilidade
os festivais, o delivery, a dor inesperada
a sabotagem, nunca mais
o futebol
.
Nunca mais o sono inconstante
a paciência, o bonzinho
nunca mais
as segundas cinzentas
.
Nunca mais o cheiro de estrume
a certeza, a convicção, o erro
nunca mais poemas vazios, frases calculadas
Downloads, propaganda
.
Nunca mais
Nunca mais a saúde perdida, o nojo, a cobrança, a tela
Nunca mais as cores, o azul, o branco, o verde
A resignação
.
Nunca mais a filosofia, as digressões baratas, o backup
O pé de página
Nunca mais
Coisa alguma
.
Nunca mais
a verdade, a construção, o humor
nunca mais o teatro
os olhos ardendo, a xícara vazia, a hesitação
.
Nunca mais
[podcast]http://www.crimideia.com.br/wp-content/uploads/pod/nuncamais2.mp3[/podcast]
(Poema inspirado diretamente na peça “O Mistério Bufo”, de Maiakóvski, descrita aqui)