Política & Economia

O salário do mendigo e a escravidão moderna

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Recebo o seguinte email, já publicado exaustivamente na internet. Útil, contudo, para pensarmos algumas questões interessantes:

Quanto ganha um mendigo? E um estagiário…?

Um sinal de trânsito muda de estado, em média, a cada 30 segundos, ou seja 30 segundos no verde e 30 segundos no vermelho.

Portanto, a cada minuto, um mendigo tem 30 segundos para faturar pelo menos R$ 0,10, o que numa hora dará: 60 x 0,10 R$ 6,00. Se ele trabalhar 8 horas por dia, 25 dias por mês, num mês terá faturado:

25 x 8 x 6 = R$ 1.200,00.

Será que essa é uma conta maluca?

Bem, R$ 6,00/hora é uma conta bastante razoável para quem está no sinal, uma vez que, quem doa, nunca dá somente 10 centavos e sim R$0,20, R$0,50 e às vezes até R$1,00.

Mas assumindo que o mendigo fature a metade: R$ 3,00/hora, terá R$ 600,00 no final do mês, que é o salário de um estagiário (é claro que depende da região do país e de outros fatores, mas enfim…) com carga de 35 horas semanais ou 7 horas por dia.

Ainda assim, quando o mendigo consegue uma moeda de R$1,00 (o que não é muito raro), ele pode descansar tranqüilo debaixo de uma árvore por mais 9 viradas do sinal de trânsito, sem nenhum chefe pra aporrinhá-lo por causa disto.

Mas isto é teoria, vamos ao mundo real…

Foram entevistar uma mulher que pede esmolas, e que sempre era vista trocar seus rendimentos na Panetiere (padaria em frente ao CEFET). Então lhe perguntaram quanto ela faturava por dia. Imaginem o que ela respondeu? É isso mesmo! Ganho de R$ 35,00 a R$ 40,00 em média, o que dá (25 dias por mês) x 35 = R$ 875,00 ou 25 x R$ 40,00 = R$ 1000,00. Então, na média, ganho R$ 937,50. E ela disse que não mendiga 8 horas por dia.

Moral da História: É melhor ser mendigo do que estagiário (ou professor). E pelo visto, ser estagiário é pior do que ser mendigo…

*****

A tal “entrevista”, que pode suscitar dúvidas, encontra respaldo na realidade, já que pesquisas indicaram que a remuneração média de quem pede esmola em sinais é realmente por volta de R$ 900 a R$ 1.000. E ainda podem contar com bolsa aluguel.

Não sejamos simplistas. Dentre o último perfil traçado dos moradores de rua no Brasil, apenas 15,9% disseram viver de esmolas. O levantamento indica também outros dados que valem a pena serem conferidos.

A situação dos estagiários não é segredo. Ainda que o assunto mereça um post específico no futuro, não é difícil achar anúncios de vagas para estagiários que paguem de 200 a 400 reais por mês, por 6 a 8 horas diárias. “Estágio”, na verdade, é a melhor maneira que o mundo capitalista moderno conseguiu de obter mão de obra qualificada a preços irrisórios e que faça tudo que é pedido. Isso quando pagam algo, já que “estágios não remunerados” em grandes empresas são uma constante. É como se o estudante infeliz devesse se submeter a tudo pela “oportunidade de ouro” de servir aquela empresa e colocar o nome dela no seu currículo.

A nova lei de estágio ajudou, mas está longe de corrigir vários absurdos.

Quem se habilita a ir para o sinal mais próximo?

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Eleições em BH e a briga de foice

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Dizem, que, no interior, as coisas se resolvem é na foice: por experiência própria, posso atestar que isto não foge muito a realidade. Mas não é preciso ir em cidadezinhas com 8 mil habitantes para presenciar coisas do gênero: Belo Horizonte, com seus 3 milhões de pessoas, uma das maiores metrópoles brasileiras, oferece “causos” muito mais interessantes.

O que se viu no segundo turno da eleição mineira foi todo tipo de baixaria que a política costuma proporcionar, ajudada pelo “raí-téqui” da internet. Márcio Lacerda, PSB, o “candidato da aliança”, apoiado pelo governador Aécio Neves e o prefeito Fernando Pimentel (extremamente populares e bem avaliados) e Leonardo Quintão, PMDB, uma figura prosaica (ha ha), deputado federal, proporcionaram momentos no mínimo burlescos para quem acompanhou a campanha. De um lado, um empresário com parca experiência política e nenhuma intimidade com as câmeras, que esperava ganhar direto no primeiro turno (e não se preparou para o segundo), e do outro um deputado com “estilo” que só estas terras poderiam proporcionar, família política e usando de um discurso piegas e manjado para tocar os mais estúpidos de sua “humanidade”, etc e tal.

Cartazes apócrifos – sem assinatura e identificação – espalhados pela cidade tentaram de todas as formas ligar Márcio Lacerda ao Mensalão. Os tipos variaram: “entenda Márcio no Esquema”, “o candidato mais rico do Brasil”, “procura-se mensaleiro”, etc. Na propaganda na TV, Quintão tentou veicular parte de um depoimento de Marcos Valério a CPI, falando sobre Lacerda, devidamente impedido pela Justiça. Praticamente toda a campanha do segundo turno de Quintão se baseou em tentar, de todas as formas, ligar Lacerda ao Mensalão, para manchar a imagem do candidato ante os eleitores.

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Lacerda, obviamente, se defendeu na TV, em debates e folhetos espalhados a quilo pela cidade, mostrando que foi inocentado de todas as acusações e o próprio Valério disse que ele não teve ligação direta alguma com o escândalo. Nos debates promovidos nesta última semana, os candidatos só faltaram “sair na porrada”. Era um tentando provar que era mais ridículo que o outro. Na internet, dois blogs, um Anti-Quintão, o outro Anti-Lacerda, trocaram todo tipo de farpas, e disponibilizaram diversos “joguinhos” onde é possível brincar com os candidatos: de chutar, atirar em suas cabeças, e por aí vai – uma nova modalidade de interação política.

Quintão, nascido em Taguatinga – DF, adotou sotaque mineiro extremamente carregado e um discurso populista, com seus slogan’s “Gente Cuidando de Gente” e “Dá Pra Fazer”. E foi ironizado de forma magistral por Tom Cavalcante, no vídeo abaixo, que se tornou hit no YouTube.

httpv://www.youtube.com/watch?v=UdrcDp5TEK4

Outra série de acusações ligando, desta vez, Quintão a esquemas de lavagens de dinheiro intermediados por Paulo Maluf e Celso Pitta vieram a tona, através do Correio Braziliense e outros veículos. Há que se lembrar que o Correio é do grupo Diário Associados, que publica também o Estado de Minas, maior jornal do estado e, sabidamente, ligado ao governador Aécio Neves. Nada mais natural que alguém se encarregasse de investigar podres no passado de Quintão e revelar isto ao público.

Nas pesquisas, Márcio saiu de uma prévia, em 15 de Outubro, de 33 pontos, contra 51 de Quintão, para terminar, na última, vencendo por 45 a 40 (tecnicamente empatados).

Tendo o desprazer de acompanhar o ridículo e o odor desagradável desta última semana, é difícil dizer qual dos dois é pior. Minha antipatia por Quintão, flagrantemente forçado e patético, contudo, é maior. Mas se fosse votar, sem dúvida que meu voto seria nulo.

Vou repetir isto ao máximo que puder: democracia com voto obrigatório é uma piada de mal-gosto. Um crime. Nunca tivemos democracia no Brasil e dificilmente vamos ter.

Para Belo Horizonte a certeza que fica é que, independente de quem vença neste domingo, a cidade estará em péssimas mãos. Salve-se quem puder.

Uptadate: Com todos os votos apurados, o resultado foi:

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Por regiões da cidade:

Zona Sul

MARCIO LACERDA (PSB)

69,58% 250.912 votos

LEONARDO QUINTÃO (PMDB)

30,42% 109.680 votos

Eleitores na zona:511.502
28,86%

Zona Centro

MARCIO LACERDA (PSB)

61,75% 93.779 votos

LEONARDO QUINTÃO (PMDB)

38,25% 58.092 votos

Eleitores na zona:209.561
11,82%

Zona Norte

MARCIO LACERDA (PSB)

56,32% 129.401 votos

LEONARDO QUINTÃO (PMDB)

43,68% 100.352 votos

Eleitores na zona:306.891
17,32%

Zona Leste

MARCIO LACERDA (PSB)

53,46% 108.295 votos

LEONARDO QUINTÃO (PMDB)

46,54% 94.284 votos

Eleitores na zona:267.267
15,08%

Zona Oeste

MARCIO LACERDA (PSB)

52,38% 184.945 votos

LEONARDO QUINTÃO (PMDB)

47,62% 168.152 votos

Eleitores na zona:477.006
26,92%

Eleitorado
1.772.227

Seções
4.059

Eleitorado apurado
1.772.227 (100.00%)

Seções totalizadas
4.059 (100,00 %)

Comparecimento
1.457.208 (82,22 %)

Abstenção
315.019 (17,78 %)

Votos válidos
1.297.892 (89,07 %)

Votos em branco
51.335(3,52 %)

Votos nulos
107.981 (7,41 %)

Para quem esperava uma eleição equilibrada, o resultado foi um massacre de Lacerda. Prova de que terrorismo político – muitas vezes – tem o efeito contrário. Dos dois, ganhou o que repudio menos. Confira o resultado oficial da sua cidade neste link.

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O corte da Opep e o capitalismo sem rumo

A Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), anunciou que vai cortar a sua produção diária em 1,5 milhão de barris, para tentar frear a queda livre dos preços do barril de petróleo – que chegou a 147 dólares em julho e agora está cotado a US$ 70.

A grande ironia da brincadeira toda são os paradoxos em que a crise mundial tratou de afundar o capitalismo. Sob a lei única e soberana do mundo – “ter lucro sobre todas as coisas, independente do que for necessário para isto” – é claro que a queda do preço do petróleo atinge diretamente o bolso dos 13 países que formam o cartel da OPEP. Fora isto, o barateamento do óleo negro é, em contrapartida, mais interessante para a maioria dos países do mundo, especialmente os pobres. Também é “ruim” para o Brasil, um dos maiores produtores mundiais.

Considerando a margem de lucro absurda sob a qual trabalham em cima, o último recurso da OPEP foi sabotar a produção, forçando descaradamente uma queda da oferta do petróleo no mercado, para tentar assim alavancar novamente o seu preço. Sendo que, até poucos meses atrás, como dito, a cotação do barril batia recordes e o petróleo era (e ainda é) uma das maiores preocupações globais para as próximas décadas, em preço e escassez.

O que a socialização da desgraça promovida pelos governos estadunidense e europeu – fazendo os contribuintes pagarem duplamente pela incompetência dos bancos e mercado financeiro – exprime é, sobretudo, que nós não podemos continuar vivendo sob os mesmos padrões em que estávamos. Que o modelo estadunidense, o american way of life, do consumo desenfreado em larga escala, que produz 3 vezes mais lixo diário que outros países desenvolvidos e 5 vezes mais que nações médias, não pode, afinal, ser a meta de existência de cada um.

Toda notícia de redução de lucros e queda na produção é tratada com imenso pesar e cria-se um novo apocalipse, como se isto fosse o sentido de continuar vivendo. Não é. E mais importante: salienta que diminuir o ritmo do “progresso” e “avanço” – que muitas vezes não passam justamente do contrário – é fundamental para qualquer um que tenha bom senso. Se os índices de lucro e produção continuarem a terem que ser batidos trimestre após trimestre, ano após ano, onde vamos parar? Ainda mais afogados na miséria e no nosso próprio lixo, real e abstrato: outro paradoxo.

O corte da OPEP só ressalta que o capitalismo, coitado, não sabe o que fazer. Está cantando, lamentando-se como a clássica canção de Maysa: “meu muundoo caiu”. E como diz a letra, nós que aprendamos a nos levantar.

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Lula: 80% de aprovação

GABRIELA GUERREIRO
da Folha Online, em Brasília

A avaliação positiva do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu para 69% em setembro deste ano, segundo aponta pesquisa CNI/Ibope divulgada nesta segunda-feira. A pesquisa foi realizada entre os dias 19 e 22 de setembro e ouviu 2.002 pessoas em 141 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

O índice é o mais alto alcançado pelo petista, além de ser o segundo melhor desempenho de um governo desde que iniciada a pesquisa, em 1982. Somente 8% dos entrevistados avaliaram o governo federal como ruim ou péssimo, enquanto 23% consideraram a condução do governo como “regular”.

Na última edição da pesquisa CNI/Ibope, divulgada em junho, 58% dos entrevistados avaliaram o governo Lula como positivo. Outros 29% consideraram o governo regular, enquanto 12% avaliaram como ruim ou péssimo. Em março de 2003, ano em que Lula foi empossado no cargo, o índice de aprovação ao governo federal foi de 51% –o que foi considerado pela CNI/Ibope como um crescimento considerável para a avaliação do governo federal.

O mais alto patamar registrado por um governo na história da pesquisa foi em 1986, quando o então presidente José Sarney (PMDB), na vigência do Plano Cruzado, obteve 72% de avaliação positiva.

A pesquisa CNI/Ibope mostra ainda que, numa escala de zero a 10, o governo federal recebeu a nota média mais alta desde que passou a ser avaliado pela pesquisa, com 7,4. Em junho, a nota média recebida pelo governo foi de 7,0.

A confiança no presidente Lula também seguiu os demais indicadores, chegando ao segundo patamar mais elevado da pesquisa. No total, 73% dos entrevistados afirmam confiar no presidente, enquanto 23% dizem não confiar em Lula. Outros 4% não opinaram ou não quiseram responder.

Em junho, 68% responderam que confiavam no presidente, contra 29% que responderam de forma negativa ao petista.

Na comparação entre o primeiro e o segundo mandato de Lula, 48% consideram o segundo governo petista melhor que o primeiro. Em junho, esse índice foi de 49%. Outros 39% consideraram em setembro os dois mandatos iguais, enquanto 11% avaliam que o primeiro governo foi melhor que o segundo.

A pesquisa foi realizada entre os dias 19 e 22 de setembro e ouviu 2.002 pessoas em 141 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Fonte: Folha Online

Comentário: Lula é um fenômeno de aprovação, para desespero de 95% da mídia e dos intelectuais brasileiros. O país cresce a taxas expressivas, a criação de emprego com carteira assinada bate recorde sob recorde (somente entre janeiro e agosto foram criados 1.151.660 postos de trabalho formais, crescimento de 7,14% em relação ao ano passado), a Petrobrás não pára de descobrir novas bacias energéticas, a inflação que ameaçou disparar já foi controlada e nem mesmo a crise mundial parece abalar a confiança do brasileiro em seu presidente.

Para quem começou colocando “medo” no mercado e na imprensa, em 2002, Lula vai muito bem obrigado. O “governo comunista” que todos temiam transformou-se num ótimo gestor do mundo capitalista, sendo infinitamente melhor sucedido que seus antecessores. E nem as inúmeras crises forçadas e golpismo midiático consideram derrubá-lo. Pelo contrário, só o fortaleceram. Alguém duvida de que o candidato apoiado por ele terá fortes chances de ser eleito? Já foi dada a largada.

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A Eterna Crise

Artigo originalmente publicado no site Duplipensar (www.duplipensar.net) em 26.07.2005.

A Eterna Crise

Foi lendo o artigo “Crise? Que Crise?” do nosso congratulado companheiro Janus Mazursky que me sobreveio o desejo de verificar algumas particularidades da propalada “crise” em que nos encontramos:

Ato I – Velharias mais velhas que outras

“Os olhos não servem de nada a um cérebro cego.” (Provérbio Árabe)

O próprio presidente Lulla deu, numa entrevista, a tônica de toda a galhofa: “Isto é prática comum em todos os partidos”, referindo-se aos recursos não contabilizados usados para financiar campanhas, o chamado caixa dois. E em vista de todas as acusações divulgadas por ele, é apropriado citar novamente Roberto Jefferson no programa Roda Viva: “Qual é a novidade? Até parece que vocês todos não sabiam disso…”. Pronto. De fato, nada do que veio à tona é novo, nada do que é continuamente desmembrado seria capaz de causar algum choque, alguma manifestação de surpresa, mas causa. Então como algo sabido entrementes há muito é capaz de gerar tanto burburinho? Há duas razões: jogo político e combustível midiático. Não me contenho em gargalhar deliciosamente quando vejo na tv políticos de olhos esbugalhados trovejando o ódio salpicado da saliva incestuosa que inevitavelmente escorre por suas bocas, lobos ferozes prontos para devorar seus irmãos e saborear o doce e aureolado prazer de ser “o bom moço”, protegidos pela égide de delatores da corrupção. Convém citar inclusive o impagável dinossauro Ney Suassuna, que declarou: “não sei se é porque eu sou neófito na política, estou apenas no meu segundo mandato de senador, mas todo esse dinheiro, todas essas pessoas, estas denúncias, me impressionam”. PSDB/PFL – e demais currais eleitorais – não se contém de alegria (enquanto nenhum respingo de lama os atinge) e com toda razão. Ser publicitário das campanhas eleitorais de tais partidos ano que vem será uma das tarefas mais fáceis do mundo. Com um banquete destes proporcionado gratuitamente por seus – em tese – adversários, nenhuma criatividade, nenhum esforço se fará necessário, tratará apenas de liberar doses homeopáticas de acusações, rebuscadas pela santidade direitista.

Por seu turno, jornalistas assumem vozes pesarosas, quiçá tétricas, para anunciar as progressivas cenas da atual tragédia encenada em terras tupiniquins. Lembro-me até de um, que, participando do programa Observatório da Imprensa, disse mais uma coisa que todos sabem: “corrupção é a melhor notícia”. Nada satisfaz mais a mídia do que as corruptelas do sistema, nenhum outro assunto é tão voluptuoso. Corrupção vende. Corrupção é a premissa perfeita para que seres baixos almejem o paraíso, ou seja, para que veículos duvidosos conquistem o respeito da população.

Voltando ao nosso escopo inicial, a pergunta martela sem cessar: se a corrupção é algo de conhecimento geral, os mecanismos de como ela se manifesta também, e quem a pratica idem, porque causa tanto alvoroço? Além de alimentar picuinhas partidárias e servir de matéria-prima para a imprensa, ela incomoda porque, sendo um “modus operandi” do capitalismo, deve permanecer compreendida tacitamente sob o arcabouço do covarde senso comum. Enquanto as entranhas permanecem protegidas por sua estrutura óssea e carnuda, podem funcionar sem infortúnio, mas assim que – inapropriadamente – assumem a vanguarda, sua natureza repugnante inquieta seu dono. É como o porco que se indigna quando chamam seu alimento de lavagem. A corrupção pode lubrificar perpetuamente as engrenagens enquanto continuar inaudita, todavia, se assume a forma do todo, deve ser expurgada ferozmente para seu local de origem. É o que todos fazem, mas é inadmissível que se declare isso, é vergonhoso, indecoroso, impopular, é inflamável demais para se praticar pirofagia, é preciso combater teu coração para permanecê-lo inexpugnável. A crise é apenas a forma mais clássica de certificar-se de sua fortitude.

Ato II – Cornucópia Excrementícia

“Fosse o que fosse (o que o homem falava), podia-se ter a certeza de que cada palavra era pura ortodoxia, puro Ingsoc. Olhando a cara sem olhos, a mandíbula mexendo sem parar, Winston teve a sensação curiosa de não se tratar de um legítimo ente humano, mas de uma espécie de manequim. Não era o cérebro do homem que falava, era a laringe. O que saía da boca era constituído de palavras, mas não era fala genuína: era um barulho inconsciente, como o grasnido dum pato”. (George Orwell, 1984, pág 55/56).

Observando o patofalar na boca de nossos pseudo-intelectuais, é impossível não concordar com Orwell, sendo que temos apenas que trocar o “Socialismo Inglês” orwelliano pelo endêmico sistema capital-burguês monopolizador onde nos encontramos. O ódio forçosamente velado da imensa maioria de nossa mídia por ver a esquerda assumir o poder em 2002 – logo apaziguado pelos compromissos familiares assumidos por Lulla – pode agora jorrar sob as condições perfeitas, sem o mínimo risco de parecerem vilões aos olhos do povo. Sob o programa da verborragia, oficializado pela corrupção, encontram o pressuposto ideal para atacar não somente o partido, mas sua ideologia, suas bases, sua militância, sua história, a revolução, o marxismo, o materialismo dialético, a verdade.

Vamos com calma. O PT está chafurdado até o limite na lama, fato. Crimes de todas as naturezas são infindavelmente descobertos, fato. A idéia vendida é de que algum titio tucano resolverá tudo isso. O que afinal isto significa? Que programa estão criticando?

Ora, o que o partido dos trabalhadores tinha de esquerdista e/ou revolucionário, já foi abandonado há muito tempo, mais precisamente no início da década de 90, quando decidiram, enfim, fazer concessões, que se tornaram progressivas, até o ponto de se unificar completamente com o que combatiam, sendo impossível haver distinção. O que o PT pratica é o mesmo que o PSDB pratica, os dois programas já foram executados, os dois são a mesma coisa, os dois falharam miseravelmente. A ideologia que nossa mídia pensa criticar é a sua própria ideologia, a lama lhe é inerente assim como todo o resto. Dessa forma, quanto mais incisivos forem, melhor será. Quanto mais implacáveis, mais duros serão consigo mesmos. A ruína das pretensões petistas é a derrocada inegável das bases neoliberais brasileiramente autenticadas.

Falta que a massa perceba tudo isso. As denúncias propagadas na tv são auto-denúncias, as críticas vorazes são a compromisso público da culpa. Ninguém se arrisca a discutir a raiz, todos querem explorar apenas o episódio em separado. Qualquer nuance de ideologia revolucionária está a anos luz deste abismo medonho. Discutir a essência seria suicídio. Pois a origem de tudo é a mesma.

O círculo vicioso do capitalismo permanecerá intocável seja qual for o desenrolar desta história. A menos que…

Ato III – Um pouco de ar, por favor!

“Ai de mim”, disse o rato, – “o mundo vai ficando dia a dia mais estreito”. – “Outrora, tão grande era que ganhei medo e corri, corri até que finalmente fiquei contente por ver aparecerem muros de ambos os lados do horizonte, mas estes altos muros correm tão rapidamente um ao encontro do outro que eis-me já no fim do percurso, vendo ao fundo a ratoeira em que irei cair”. ” – Mas o que tens a fazer é mudar de direção”, disse o gato, devorando-o.” (Franz Kafka, Fábula Curta, in “Contos”)

A desconcertante precisão kafkiana é exortativa, não axiomática. Trafegamos e nenhum dos caminhos que percorremos nos levou a lugar algum. Caímos sempre no mesmo buraco, seja ele o da ignorância, do mercado, da ansiedade, do despreparo, do engano, da comodidade.

Os políticos se apressam em dizer que “apesar de tudo, as instituições democráticas serão preservadas”, como se isto fosse capaz de prover conforto à população e significasse algo positivo. Que “instituições democráticas”? Instituições democráticas nunca existiram. Nossos governantes fingem não saber o que é isto, preferem não saber, com efeito, não podem agir de acordo. O que você faria se seu funcionário jamais atendesse suas necessidades, desprezasse suas reinvidicações, escarnecesse sua importância, roubasse seus bens e agisse exclusivamente de acordo com seus interesses, fingindo que tu não existes? O demitiria, certo? É uma situação totalmente inaceitável e absurda. Algo que, uma vez identificado, seria extinto de imediato. Pois então. Perdemos tudo, todo respeito, toda importância, será que até nossa capacidade de mudança?

Talvez não estejamos todos mortos, talvez haja um mundo melhor após o eclipse. Como alertou o Pink Floyd na última frase de sua obra prima “The Dark Side Of The Moon”: “e tudo sob o sol está em perfeita harmonia, mas o sol é tapado pela lua.” O eclipse não se originou agora, é decrépito, senil, por trás desta crosta renovada do sistema, que tenta-nos provar que suas engrenagens são passíveis de choque, esconde-se a verdadeira essência putrefata do que nos governa: o capitalismo em sua forma pura. Nossa atualidade é fruto apenas de inúmeras trocas de pele, de “crises” fabricadas pela conspiração favorável ao bem estar do mercado, contudo, viver isso não é nada démodé: respiramos o capitalismo cotidianamente, o sentimos quando percebemos que sempre teremos que pagar mais caro por nossa comida, nosso transporte, nosso lazer, nossos vícios, nossa higiene, nosso estudo, nossa vida, quando temos a consciência de que iremos pagar sempre mais do que as coisas valem e receber menos do que merecemos. Obter sucesso em nossa sociedade significa tão somente canibalismo, pisar sob os demais, uma vitória paliativa e unilateral da oligarquia burguesa. Ter dinheiro não é um crime, conquistá-lo é que o é. Conquista implica vitória, vitória implica derrota, derrota transparece disputa, disputa implica ambição, ambição transparece desigualdade, desigualdade gera luta, luta implica injustiça, injustiça significa a permanência do capitalismo. Qual a última vez que vistes o sol? Acaso lembra-se da última ocasião que desfrutaste a vida? O que estás deixando de fazer para estar aqui pensando?

O predatismo precisa acabar. Os deuses do capital, destituídos. Os valores, restaurados. A verdade, glorificada. O mundo suplica por sua reconstrução. Há muito trabalho para ser feito.

A revolução clama. Atenda ao seu chamado.

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Executiva nacional do PT impõe veto contra aliança com o PSDB em Minas

Proibição da coligação no estado põe o partido em situação política delicada

A novela que se arrasta já há alguns meses em Belo Horizonte, entre a oficialização ou não da aliança PT-PSDB teve mais um capítulo hoje. A executiva nacional do Partido dos Trabalhadores decidiu pelo veto ao acordo, na proporção de 13 votos a 2. Desta forma está impedida, em primeira instância, a coligação entre os dois adversários históricos para a candidatura à prefeitura da capital mineira, apoiando o nome de Márcio Lacerda, do PSB. Resta agora a última possibilidade, que é o diretório nacional, composto por 84 integrantes, que também irá avaliar a decisão no próximo dia 30.

Demonstrando um desacordo de diretrizes entre os planos majoritários e as bases locais do partido, a decisão pode trazer um imbróglio político desagradável a ambas as partes. Manifestando posições totalmente opostas, o resultado de hoje deixa claro o profundo racha existente entre os dois pólos. Fernando Pimentel, prefeito da cidade, que passou os últimos dois dias em Brasília tentando costurar as alianças para um resultado positivo, viu suas tentativas frustradas.

Tanto Pimentel quanto Aécio Neves, governador do estado, já deram declarações incisivas de que, independente do que o diretório nacional diga, a aliança em Belo Horizonte será implementada, “pelo bem da cidade e por simbolizar uma vontade de todas as partes interessadas num plano de desenvolvimento local”. Apesar das diferenças explicitas, o pivô do acordo pode ser justamente o presidente Lula, que disse recentemente que “não vê obstáculos” para que o aliança aconteça. Mantendo um bom relacionamento com Aécio Neves, Lula pode dar a palavra final para que a situação não se torne tão politicamente desastrosa.

Para o cientista político Marcelo Freitas, a decisão de momento compromete o próprio histórico do PT: “Quando você ignora os pensamentos dos diretórios locais, mata o que o partido tem de mais importante, que é a sua base. E ir contra a sua base é contradizer a própria tradição do PT, que sempre respeitou muito a sua base. Isso de certa forma mancha este respeito histórico à militância. Talvez o PT nacional não conheça a realidade de Minas, da base daqui, o “chão de fábrica”, como dizem. Do ponto de vista estratégico, o PT cometeu outro equívoco, porque isso acabou de certa forma impedindo uma aproximação do Aécio com Lula. Querendo ou não, o peso de Aécio em Brasília é grande, podendo ajudar a aprovar projetos do governo. Além disso ele pode minar as alianças do PSDB entre Alckmin e Serra no plano nacional. Ou seja, pode funcionar como um nome duplamente útil ao PT.”

Analisada todas as instâncias, a novela terá de necessariamente chegar a um fim. Os arranjos tem exatamente 4 dias para acontecer.

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