Literatura

James Joyce: Bloomsday e a desconstrução do romance

Mesmo atrasada, aqui vai minha homenagem ao Bloomsday, com um breve histórico-análise de um dos meus escritores favoritos: James Joyce

16 de junho é o dia que se comemora, em todo o mundo, o Bloomsday, data na qual a ação do livro “Ulisses” se passa. Clássico maior da literatura do século XX, obra daquele que é considerado um dos maiores escritores de todos os tempos, James Joyce. O irlandês, nascido em Dublin, construiu toda a trama de seu personagem Leopold Bloom em torno das particularidades da capital. O detalhamento é tão impressionante que, segundo muitos, se Dublin for, porventura, inteiramente destruída, seria possível reconstruir sua estrutura a partir do livro de Joyce.

Pelas ruas da cidade, os personagens centrais da narrativa – Bloom e Stephen Dedalus, um jovem intelectual arrogante, considerado o alter-ego do autor – vivem situações banais, que Joyce contrasta com as da obra-prima do mundo clássico, a ”Odisséia”, de Homero, que narra as aventuras de Ulisses na tentativa de retornar para a mulher, Penélope, e o filho, Telêmaco, em Ítaca.

A data não foi escolhida ao acaso. Trata-se do exato dia que Joyce teve o primeiro encontro com Nora Bernacle, sua futura mulher. Na Irlanda, é um momento sagrado do calendário nacional. Por todo o país são feitos festividades, palestras, shows, exposições, leituras e comemorações das mais diversas naturezas.

O legado “joyceano”, de valor imensurável, revolucionou a literatura de sua época e influenciou grande parte da geração pós-modernista, tais como William Faulkner, Albert Camus, Samuel Beckett, Saul Bellow, Anthony Burgees, Gabriel García Márquez e Toni Morrison.

Trabalhando em cima da introspecção, do onírico, de símbolos, metáforas, alusões, referências filosóficas, poéticas, clássicas e até mesmo de canções, utilizando múltiplas vozes narrativas, um jogo de palavras extravagante, criando neologismos, desprezando a linearidade e a lógica, recheando seu texto de abstrações e inovando o monólogo interior, Joyce também aperfeiçoou a técnica do fluxo de consciência – utilização de elementos do inconsciente para tratar de questionamentos internos. Tudo isso para retratar a nossa relação com a vida, indo a fundo em cada elemento de que ela se constitui.

As inovações literárias de Joyce já foram comparadas ao impacto causado pelos trabalhos de Einstein e Freud. Depois de “Ulisses”, lançado em 1922, o limite de sua complexidade e inteligência, lapidada durante 17 anos, deu luz à “Finnegans Wake”, definido por ele próprio como “o romance para acabar com todos os romances”. O livro hermético por excelência, FW traz uma linguagem estilhaçada, torcida e retorcida em divagações e entrelaçamentos sem fim de um lexicologismo bastante peculiar, abordando, segundo consta, impressionantes 65 línguas.

É por todo significado histórico da obra joyceana que as louvações deste “Bloomsday” são justificáveis. Brindemos então!

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Literatura

Aforismos do Dia

Cortesia da casa:

“As coisas mais estúpidas que ouço costumam vir de quem se acha demasiadamente livre”.

“Conheço estátuas com maior vivacidade que grande parte dos “intelectuais”: a vida não se realiza na teoria”.

“Perde a razão quem se julga dono dela”.

“Em matéria de amor, qualquer conceituação é risível”.

“O homem tem a boca maior que a alma”.

“Toda a crítica do nosso tempo não passa de exercícios fúteis de egos inseguros almejando reconhecimento”.

“Eis, aliás, o que o homem mais teme: a insegurança. E quanto mais é, mais feroz se torna”.

“Maquiavel estava certo quando dizia que – as aparências são aquilo que, de fato, nós realmente somos – tolo quem discorda. E tolo quem crê em verdades absolutas”.

“O radical, tomado por seu significado popular, não semântico, é a figura mais detestável que pode existir”.

“O mundo é tão massificado que cada pessoa sente, age, se comporta e pensa de maneira diferente”.

“Não existem rebanhos. O “homem de massa” é apenas um fetiche que a crítica ainda não conseguiu se livrar”.

“Desconfie das receitas prontas, das reflexões fechadas e de pessoas com ideologias: basta sentir o cheiro desagradável que exalam”.

“Quem adora se passar por extremo tende a ser os mais carentes e solitários que existem. Falam muito e vivem pouco. Sabem demais. Sua maior alegria é achar quem lhes dê atenção”.

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Listas/Citações

Um pouco de Cioran

Emil Cioran é um dos pensadores mais idiossincráticos – e divertidos – de nosso tempo. Em proporção, talvez eu discorde de 60% do que ele fala e ache os outros 40 geniais. Ele próprio, contudo, não deveria concordar com o que dizia: a coerência em Cioran é uma contradição. Por mais que negue, o romeno preza pelo estilo, pela acidez, o resto é resultado de observações amargas e curiosas da vida, mas sempre com a preocupação de dizer algo. Ele sabe rir de si mesmo…predicado mais do que fundamental para qualquer ser humano saudável: tenha medo de quem não consegue rir de si próprio.

Um pouco do rapaz em “Silogismos da Amargura”:

Sin nuestras dudas sobre nosotros mismos, nuestro escepticismo sería letra muerta, inquietud convencional, doctrina filosófica.

*

No queremos seguir soportando el peso de las “verdades”, continuar siendo sus víctimas o sus cómplices. Sueño con un mundo en el que se muriera por una coma.

*

La historia de las ideas es la historia del rencor de los solitarios.

*

Es fácil ser “profundo”: no hay más que dejarse invadir por las propias taras.

(…)

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Esportes

Adeus, Dunga?

Dunga e seu modelito duvidoso (criado pela filha), com a tradicional feição preocupada à beira do gramado

Dunga é uma destas invenções da CBF. Praticamente inexperiente como treinador, foi instantaneamente catapultado à liderar a principal (e mais cobrada) seleção de futebol do mundo. Ano passado, sem motivo aparente, apesar da conquista da Copa América – dum futebol sofrível – foi escolhido o melhor técnico do planeta, provavelmente quem votou não viu a seleção jogar.

Agora, o Brasil passa por um dos piores momentos nas Eliminatórias, mas, além disso, o que causa preocupação é o “futebol” horroroso demonstrado pelo time. Falta de padrão, técnica, entrosamento, espírito coletivo, ânimo, jogadas…uma equipe totalmente solta a esmo, perdida em campo, onde não se vê, em absolutamente nada, a mão do treinador. Como se não bastasse, Dunga, com seu temperamento difícil, já cansou a imprensa e o próprio auxiliar, Jorginho, bem como alguns jogadores, a exemplo de Kaká, que deu declarações em que alfinetava o comandante ao programa “Bem, Amigos”, da Sportv.

Não é só a torcida – entoando “Adeeuus, Dungaaa, adeeuus, Dungaaa” após o medonho empate com a Argentina no Mineirão – que torce pela saída. Percebe-se, de modo nítido na imprensa, da cobertura após o resultado frente aos “hermanos”, um tom claramente favorável à tentar propiciar, de alguma forma, a saída do treinador do comando da seleção brasileira. Os textos desferem inúmeros ataques sutis à credibilidade do técnico, aproveitando toda e qualquer ligação para alimentar este clima precoce de “adeus”.

Justifica? Sim. E este é um sinal claro de que ele não deve durar muito no cargo. Sem um técnico decente, a “equipe” torna-se apenas um amontoado de jogadores reunidos às pressas que não sabem o que fazer em campo. É péssimo treinador e tem péssimo carisma: ou seja, falha na técnica e falha ao tentar propiciar um ambiente agradável e psicologicamente estimulante aos jogadores.

Substituí-lo é uma questão complicada. Muricy Ramalho, atual São Paulo, já provou que é capaz dentro de campo e é queridinho da imprensa. De estilo também rabujento, pelo menos tem qualidade para sê-lo. Outro nome possível seria o de Zico, que fez trabalho razoável na seleção do Japão e um melhor ainda no Fenerbahçe, da Turquia, ao levar o time a absolutamente inédita classificação para as quartas-de-final da Liga dos Campeões da Europa. Zico, contudo, tem um relacionamento conturbado com Ricardo Teixeira, fruto principalmente da fatídica Copa de 98, quando fazia parte da comissão, e dificilmente deve ser chamado. Vanderlei Luxemburgo, além de já ter virado muito mais empresário e marketeiro do que técnico de futebol, teve sua chance e desperdiçou. Seria um retrocesso entregar a ele novamente.

A questão está em aberto. Dunga pode até durar um pouco mais no comando, mas o futebol da Seleção Brasileira já deu adeus dos gramados faz tempo. Ainda bem que não jogamos a Eurocopa.

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    Esportes

    Boston Celtics campeão pela 17º da NBA!

    Com uma vitória esmagadora sobre o Los Angeles Lakers por 131 a 92, na 6º partida das finais, o Boston Celtics conquistou seu 17º título da NBA e alargou a vantagem histórica sob os Lakers (14 títulos), além de, em 11 finais disputadas pelos dois times, os Celtics venceram 9!

    Após a desastrosa temporada 2006/2007, onde venceu apenas 24 partidas, o Celtics reformulou seu time com a chegada dos astros Kevin Garnett e Ray Allen, formando o “big 3” com Paul Pierce. Das 24 do ano anterior, o time venceu 66 partidas das 82 da fase de classificação em 2007/2008, com a melhor campanha geral e a melhor defesa.

    Um time surgido diretamente dos imigrantes irlandeses (não à toa seu nome, seu símbolo, etc), humilhados durante séculos nos Estados Unidos vieram a se tornar os maiores campeões de um dos esportes mais populares daquele país!

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    Filmes

    The Village

    A Vila – M. Night Shyamalan – 2004 – ****

    Havia admirado alguns aspectos de “O Sexto Sentido” e “Corpo Fechado”, filmes que catapultaram o diretor M. Night Shyamalan para um nível de adoração absurdo. Gostado, mas não considerado “obras primas inesquecíveis”, como boa parte da crítica. “Sinais”, me decepcionou, não só pelo roteiro furado quanto pelo filme bem meia-boca, em si, além de eu não gostar da temática de ET’s e OVNI’s por achar ridícula demais.

    De lá pra cá, abandonei Shyamalan. Um exercício de ranço e má vontade que, após assistir “A Vila”, não se justifica. De longe (mas de longe), a melhor obra dele. Conceito e execução geniais, dum filme quase infalível que, agora sim, justifica sua condição de “gênio”. Seja pela fotografia irretocável de Roger Deakins (mestre), explorando como poucos a luz, sombras, as cores e o ambiente, seja pela câmera estilosa de Shyamalan, conseguindo fugir do óbvio dentro de um estilo já tão saturado, passando ainda pelo ótimo elenco, onde se destaca um transformado Joaquim Phoenix e a tensa Bryce Dallas Howard.

    Como se tornou marca do diretor indiano, “A Vila” é um filme de metáforas, referências, alusões e sinergias. Dos “sentidos”, em suma. A dualidade do vermelho-amarelo, a nuance bíblica, a questão do “perceber/ver”, coisas diferentes que exaltam a sensibilidade e a cegueira da maioria dos personagens  (não de Ivy), a própria utopia (de Thomas Morus a Aldous Huxley) da criação da Vila, trazendo uma relação direta com a situação do mundo atual e a vida urbana que, clichê ou não, é real e bem feita no longa.

    E o roteiro, surpreendentemente, funciona e não possui falhas. Um ótimo suspense dentro de uma bela estória de amor (ou vice-versa) e uma fábula moderna da condição humana, Shyamalan consegue reunir na película inúmeros elementos interessantes e bem construídos, aliado à um talento artístico, uma direção e equipe admirável.

    Aprendi a não subestimá-lo e, em troca, ganhei um grande – e delicado – filme, cheio de plástica e essência, coisa que poucos são capazes de fazer.

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    Filmes

    Rock Star

    Rock Star – Stephen Herek – 2001 – ***

    Demorei muito tempo para ver este filme. Esperava tão pouco dele que demorei 7 anos para dar uma chance. Me enganei.

    “Rock Star” é um deleite não só para qualquer fã de metal como foi muito bem produzido e tem atuações convincentes. O clichê, claro, mostra a odisséia na vida de um astro do rock que é convidado para integrar a banda a qual prestava tributo. Inspirado na história real de Tim “Ripper” Owens, chamado para ser o frontman do Judas Priest, permanecendo no grupo de 1996 a 2004 e gravando dois álbuns de estúdio (controversos) e dois ao vivo (excelentes).

    Os excessos, o choque da mudança de vida, os cacoetes do estilo e todo um universo próprio retratado de forma eficaz e bem filmada. A banda, formada por músicos de verdade como Jason Bonham, Jeff Pilson e Zakk Wylde (todos muito respeitados no rock/metal), além dos bons Mark Whalberg, Dominic West e Jennifer Aniston, Rock Star é um filme surpreendente e despretensioso que no final acaba acima da média. Se não chega ao nível de “Quase Famosos”, é tão bacana quanto.

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